Publicado em: 22/06/2022.

O Tribunal entendeu que a possibilidade de requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos fere o pacto federativo.

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3454 e reafirmou entendimento de que constitui ofensa ao princípio federativo a requisição administrativa de bens ou serviços por uma unidade federativa a outra.

Em sessão virtual encerrada em 20/6, por unanimidade, o Tribunal excluiu do artigo 15, inciso XIII, da Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde – SUS (Lei 8.080/1990) interpretação que possibilite a requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos.

Conflito com a Constituição

Na ação, o partido Democratas (DEM) argumentava que o dispositivo embasou a intervenção decretada pelo governo federal em hospitais do Rio de Janeiro (RJ) em 2005. Segundo a legenda, o dispositivo deixa em aberto a interpretação sobre quais pessoas jurídicas ficam sujeitas à requisição, em conflito com a Constituição, que só permite, em caso de perigo iminente, a requisição de bens de propriedade particular, e não públicos, como aconteceu no caso da intervenção no Rio de Janeiro.

Horizontalidade

No voto condutor do julgamento, o ministro Alexandre de Moraes explicou que o dispositivo impugnado trata da possibilidade de requisição no contexto das atribuições do SUS e, portanto, de competência comum entre os entes federativos. A hipótese, segundo ele, pressupõe a existência de uma situação de necessidade coletiva, urgente e transitória, que afetará todos os níveis de entes federativos, exigindo coordenação horizontal entre eles.

Nesse sentido, para o ministro, não é possível estender a hipótese do artigo 5, inciso XXV, da Constituição da República, que prevê a requisição administrativa de bens particulares em caso de iminente perigo público, às relações entre entes federativos, que devem ser caracterizadas pela horizontalidade e cooperação.

A seu ver, a interferência da União sobre bens e serviços dos entes subnacionais foi admitida pelo constituinte apenas nas excepcionais hipóteses de intervenção federal e estado de sítio, sendo descabida a interpretação que a permita em cenário de normalidade institucional, mesmo no contexto extraordinário de pandemia de covid-19.

Ele lembrou o recente julgamento da Ação Cível Originária (ACO) 3463, em que o Plenário referendou medida cautelar para impedir que a União requisitasse insumos para a fabricação de vacina contra o coronavírus adquiridos pelo Estado de São Paulo, sob pena de violação da autonomia estatal.

Para o ministro, a possibilidade de requisição pela União de bens públicos afetados ao desempenho de competências dos entes federativos diversos subverte a própria repartição constitucional de competências administrativas, em desfavor da autonomia e equilíbrio do pacto federativo; sendo, portanto, flagrantemente inconstitucional.

Reajuste

Relator do processo, o ministro Dias Toffoli havia votado em sessão anterior pela improcedência do pedido, mas reajustou seu voto para acompanhar o entendimento do ministro Alexandre de Moraes, na linha da mais recente jurisprudência da Corte.