Citações autorizadas em Tomada de Contas Especial fundamentam a possibilidade da responsabilização de holdings por omissão no dever de supervisionar suas subsidiárias. Entendimento provém da análise de contrato celebrado entre a Petrobras e o Consórcio Queiroz Galvão-Galvão-Iesa (QGGI) para fornecimento de bens e serviços ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

 

Na sessão de 11 de agosto de 2021, o Plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) deliberou sobre Tomada de Contas especial (TCE) referente ao Contrato 0858.0060702.10.2, celebrado entre a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) e o Consórcio Queiroz Galvão-Galvão-Iesa (Consórcio QGGI). O objeto do contrato era o fornecimento de bens e prestação de serviços relativos à Unidade de Hidrotratamento de Destilados Médios – UHDT (U-2500), incluindo a Unidade de Hidrotratamento de Querosene (U-2600) e Subestações Elétricas Unitárias (SE-2500 e SE-2600), todas do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Acórdão 1941/2021 – Plenário, além de corroborar com um débito de aproximadamente R$ 216 milhões (data-base dezembro/2020), calculado por estudo econométrico registrado nos Acórdãos 3089/20151583/20162619/2019 e 1568/2020 , todos do Plenário, autorizou a citação dos responsáveis que, de alguma forma, participaram das fraudes nas licitações, seja pelo recebimento de vantagens indevidas (propinas) ou pela aferição de lucros indevidos.

Imputação de responsabilidade a empresas controladoras (parent companies ou holdings) pelos atos de suas subsidiárias

O voto do Acórdão 1941/2021 – Plenário apresenta ponderações sobre a possibilidade de responsabilização de empresas controladoras (holdings) pelos atos de suas subsidiárias, destacando que não acolheu, por hora, a proposta da Secretaria Extraordinária de Operações Especiais em Infraestrutura (SeinfraOperações) de citar a Queiroz Galvão S.A., holding da Construtora Queiroz Galvão S.A., “sem prejuízo de que, em sendo demonstrada a contribuição desta holding para as condutas irregulares, a citação seja ampliada posteriormente”. Vejamos detalhes da decisão:

Tal conduta, omissão na supervisão por parte das empresas controladoras, poderia, em verdade, ser aplicada a qualquer caso de fraude nas empresas controladas. Seria o mesmo que entender que ou a holding estaria sendo conivente com os ilícitos, ou teria faltado com seu dever de supervisionar, e de qualquer forma seria responsabilizada de forma solidária.

Mais recentemente, a legislação brasileira até caminhou nesse sentido. De acordo com a Lei 12.846/2013, as sociedades controladoras respondem solidariamente com as controladas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. (…)

Nesse sentido, a proposta de citação das holdings por omissão no dever de supervisionar suas subsidiárias poderia ser adotada se atos tratados nesse processo fossem posteriores a 29/1/2014, quando ganhou vigência a citada lei. A partir daquele momento, a responsabilidade das holdings passou a ser objetiva, dispensando-se qualquer tipo de análise para os atos praticados a partir de então.

Porém, os autos cuidam de um procedimento licitatório ocorrido ainda em 2009, bem antes da publicação do mencionado normativo, de modo que é necessário demonstrar o liame causal entre a conduta irregular da empresa controladora e o débito apurado, consoante este Tribunal tem feito até aqui. (grifos acrescidos)

A propósito, o Acórdão 909/2021 – Plenário, referente à Unidade de Destilação Atmosférica e a Vácuo (UDAV) do Comperj e deliberado em abril de 2021, apresentou o mesmo raciocínio supra. Além disso, o Acórdão 626/2021 – Plenário, da Unidade de Coqueamento Retardado (UCR) do Comperj, acompanhou integralmente a proposta da unidade técnica, pois naquele caso o Tribunal entendeu estarem presentes os requisitos para a responsabilização direta das holdings.

Antes dessas decisões, os Acórdãos 2005/20172014/2017 e 874/2018, todos do Plenário do TCU, já haviam tratado de responsabilização de empresas controladoras (holdings) em razão de atos irregulares praticados por suas controladas. O Colegiado consignou o entendimento de que cabe a responsabilização solidária das holdings em casos de irregularidades que tenham contado com sua participação. A referida participação pode ser comprovada a partir de evidências que indiquem atuação de diretores das holdings no cometimento das ilicitudes.

Não se deve perder de vista também posicionamento recente (12/2/2021) do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, em que o Ministro Edson Fachin proferiu decisão em sede de medida cautelar, relacionada a citação de holding na TCE da Unidade de Hidrocraqueamento Catalítico (UHCC) do Comperj (MS 37.578/DF), valendo destacar:

Desta forma, não observo, prima facie, a alegada afronta a direito líquido e certo da Impetrante. Contrariamente ao afirmado na inicial, a leitura do ato ora questionado conduz à conclusão de que a Corte de Contas entendeu pela desnecessidade de aplicação, ao caso, do instituto da desconsideração da personalidade jurídica por entender presentes os elementos necessários à responsabilização direta da entidade controladora.

Concluiu a Corte, nessa esteira, que a empresa controladora se omitiu no exercício do dever de fiscalizar a atividade de sua controlada, agiu com conivência ou negligência na apuração de atos irregulares praticados por seus administradores, do qual se beneficiou e deles deveria saber, e deixou de agir para impedir sua prática, razão pela qual deveria ser responsabilizada diretamente.

Sendo assim, dentro de uma esfera de cognição não exauriente, própria do exame cautelar pleiteado, entendo que inexiste, no ato impetrado, ilegalidade manifesta apta a ensejar o provimento liminar requerido, porquanto a autoridade coatora decidiu a questão à luz das normas que regem a matéria. (grifos acrescidos)

A unidade técnica do TCU responsável pelo processo que resultou no Acórdão 1941/2021 – Plenário foi a Secretaria Extraordinária de Operações Especiais em Infraestrutura (SeinfraOperações). O relator é o Ministro Vital do Rêgo.